A Escola Internacional Transdisciplinar Aú Capoeira,
cuja política pedagógica transgride a lógica tradicional da educação disciplinar no ensino
da capoeira, vem através deste artigo da professora Patrícia Limaverde
contribuir para uma reflexão mais profunda acerca da transdisciplinaridade como
uma perspectiva concreta de transformação no método educacional da capoeira
atual.
Mestre
Pop
Edgar
Morin: seu pensamento transdisciplinar e a educação planetária
Profa.
Patrícia Limaverde Nascimento
Nesta edição, vamos conhecer um pouco mais sobre
esse grande pensador da atualidade. Edgar Morin nasceu em 1921 em Paris. Teve
que trocar seu nome para livrar-se do nazismo, foi comunista e rechaçado pela
academia parisiense. Livre de fronteiras disciplinares, Edgar Morin pensa de forma
transgressora e complexa. Interliga conhecimentos de distintas áreas,
estabelecendo uma comunicação capaz de dotar de sentido o saber. Propõe a
interligação entre ciência, artes e tradição; entre sujeito, objeto e
conhecimento produzido; entre corpo, mente e sentimentos.
Questionando a separação dos conhecimentos em
disciplinas que não se comunicam entre si, argumenta que na escola tradicional
aprendemos a separar e analisar sem, contudo, aprendermos a relacionar e a
interligar. Seguimos nessa lógica da “separação” e da “distinção” encarando o
ser humano como sendo corpo, mente e sentimentos, partes disjuntas entre si,
ignorando que esses são três aspectos de um todo indivisível e complexo.
Em níveis mais amplos, continuamos a mesma lógica de
separação e disjunção. A discriminação social, a estratificação das pessoas em
camadas sociais ou em níveis sociais, ou ainda em castas. As guerras e a falta
de diálogo intercultural. A incapacidade de compreender as necessidades e os
pontos de vista do outro, de outra cultura, de outra comunidade.
Segundo Morin, nosso atual modelo de educação,
fundado sobre a lógica da disjunção, é incapaz de perceber as relações
existentes entre os conhecimentos, é incapaz de conceber e contemplar, em seu
currículo e sua didática, o ser humano como um todo indiviso.
Desta maneira, contribui para o distanciamento cada
vez mais crescente do ser humano para com os outros e para com a natureza. Sem
falar no desconhecimento do ser humano em relação a si próprio, os seus desejos
internos, suas necessidades, seus sentimentos, medos e anseios. Para Morin,
todo conhecimento é uma tradução e uma reconstrução. Não existe um conhecimento
absoluto, ao contrário, o conhecimento é sempre passível de erros e ilusões. A
idéia de que todos percebemos a mesma realidade é uma ilusão.
A partir da nossa percepção individual, traduzimos
os estímulos que recebemos do exterior e reconstruímos a realidade conforme
nossos próprios processos internos. Ou seja, o que achamos que é a realidade,
na verdade é uma interpretação particular, individual e só partilhada através
da linguagem.
A educação tradicional, portanto, adotou um único
modelo de realidade que é postulado nos livros didáticos que são perpetuados
geração a geração. Os professores são formados a partir de uma simplificação de
mundo onde eles acreditam que é possível simplificar a realidade para ser
melhor apreendida ou transmitida a seus alunos.
Este é um grande obstáculo o qual a educação
planetária, estruturada sob um Paradigma da Complexidade e não um paradigma da
simplificação, deve conseguir transpor.
Os conhecimentos que criamos na escola tradicional,
simplificados e simplificantes, passam a ser tratados quase como dogmas e esses
dogmas passam a “controlar” a escola, os currículos, didáticas e sistemas de
avaliação. Controlam o fazer do professor, a estrutura das salas de aula, os
corredores e pátios. Uma educação simplificadora e dogmática, disciplinar,
atrofia a aptidão de contextualizar os conhecimentos. Valoriza muito mais a
separação que a associação de idéias num todo significativo.
A educação planetária deve caminhar em direção às
associações, não só analisando a realidade, mas estabelecendo relações entre os
conhecimentos construídos. Relacionando não somente conteúdos disciplinares de
diferentes áreas, mas também indivíduo, sociedade e natureza; corpo, mente e
emoções. A identidade humana, o que nos torna humanos, o que nos une enquanto
seres humanos? Essa é uma questão que não pode ser ignorada pela educação
planetária.
Somos todos muito parecidos geneticamente. Enquanto
indivíduos de uma mesma espécie temos as mesmas necessidades. Ao mesmo tempo,
somos diversos, em cultura, em organização de sociedades, raças, línguas.Somos,
ainda, parte de uma natureza indivisível. Dependemos de interligações com
outros seres vivos, com seres não vivos, somos natureza.Essas são as três
dimensões do ser humano: enquanto individuo, enquanto espécie, enquanto ser
social.
O ser humano está ameaçado em todas as suas
dimensões. Esse pensamento simplificador da realidade fez com que, ao perdermos
a visão do todo e suas ligações, produzíssemos conhecimentos capazes de nos
distanciar cada vez mais da vida natural e social.Produzimos ameaças a nós
mesmos. Enquanto espécie estamos ameaçados constantemente por perigos de
guerra, de desastres nucleares, perigos causados pelo aquecimento global.
Enquanto ser social, estamos ameaçados por um
totalitarismo do capital, por uma economia que invade fronteiras e busca uma
homogeneização capaz de aniquilar culturas em prol da criação de consumidores
para alimentar o mercado.Enquanto individuo, o ser humano se perde de si mesmo,
ignora sua espiritualidade, seus anseios, seus desejos e medos. Ameaça a si
mesmo e cai, cada vez mais no abismo das doenças da modernidade: depressão,
ansiedade, obesidade, dentre outros transtornos severos.
Devemos, portanto, através de uma educação
planetária, nos proteger enquanto espécie, enquanto ser social e enquanto
indivíduos. A escola para uma educação planetária deve contemplar esses
aspectos em seus planos curriculares, na didática e atividades cotidianas, em
uma nova concepção espacial da escola.
Você, professor@, tem alguma idéia de como favorecer
esse processo de transformação? Em “Atividades Transdisciplinares” ofereço uma
proposta de “Teia Curricular: o cuidado com o Indivíduo, com o Meio Social e
com o Meio Natural”. Em “Vídeos sobre Edgar Morin” há uma coletânea dos
melhores vídeos sobre as principais idéias desse grande pensador. Em “Links
sobre Edgar Morin”, fiz uma lista de links interessantes para aprofundar a
discussão. Espero que possamos pensar e repensar a educação. Como Edgar Morin
fala “reformar o pensamento e repensar a educação”!Uma boa leitura a
tod@s!Profa. Patricia Limaverde Nascimento